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Dyana Santos – Arte visual autobiográfica – Crítica e cheia de explosões de sentimentos!

Dyana Santos é uma artista mineira, nascida em Belo Horizonte

Mestre em artes visuais pela Escola de Belas Artes da UFMG, graduada em pintura pela mesma escola, com continuidade de estudos em escultura.

Já participou de exposições em Contagem, Belo Horizonte, Sete Lagoas, Nova Lima e Jataí/GO, conquistando premiações importantes como o primeiro lugar no XVI Salão Nacional de Arte de Jataí em 2017 e primeiro lugar no VII Salão Itabirito Regional, em 2015.

Em suas obras, trabalha temáticas do corpo e interatividades, com especial interesse em abordagens feministas que exploram criticamente as implicações das estruturas sociais atuais.

Quando despertou o gosto e a dedicação pela arte?

Meu despertar se deu de maneira muito orgânica. Como a maioria de meus colegas artistas, eu também gostava muito de desenhar e colorir quando era criança. A consciência da arte e a escolha por me dedicar a ela só veio mais tarde, no momento de escolher uma profissão.

Tenho uma lembrança remota de minha mãe me ajudando a fazer o para-casa do jardim de infância. Lembro que a tarefa consistia em desenhar a nós mesmos ou pessoas da família, algo do tipo, e comecei a fazer bonequinhos palito. Minha mãe questionou porque eu estava desenhando as pessoas daquela maneira, ao que falei que tinha aprendido com alguma coleguinha. Ela então pegou o lápis das minhas mãos e, numa outra folha de papel, desenhou uma pessoa do jeito dela, explicando que eu também poderia inventar o meu próprio jeito de desenhar.

À partir deste incentivo direto de minha mãe, cresci num lar onde o desenho se fazia sempre presente nas plantas de casas para projetos de eletricidade que meu pai desenhava e nos modelos de roupas que minha mãe copiava das revistas ou criava. Se, por um lado não tive acesso a museus ou livros de arte quando criança ou adolescente, hoje percebo o quão rica estas experiências foram neste meu despertar para a arte. Não por coincidência, atualmente desenvolvo um trabalho escultórico que envolve figura humana, referencias da costura, na maneira como modelo as partes da escultura, e detalhes em fios de cobre, metal que me remete ao ofício do meu pai.

Por gostar de desenhar pessoas e roupas, achava que queria fazer moda. O curso ainda não existia na UFMG, então tentei Belas Artes em meu primeiro vestibular. Não passei. Em meu segundo vestibular, tentei nutrição. Cheguei a fazer cinco períodos, até entender que as únicas coisas de que eu gostava no curso eram as aulas de anatomia e os desenhos de citologia que tínhamos de fazer. Foi então que decidi por abandonar o curso e tentar a reopção para artes visuais. Lembro do sol dourado a iluminar tudo em câmera lenta no dia em que de fato escolhi a arte; foi um encontro comigo mesma. Desde então, já fazem doze anos que andamos de mãos dadas!

Percebo a crítica e explosão de sentimentos nas suas obras. Como você descreve essa influência e inspiração em seu trabalho?

Acredito que fui aprendendo mais sobre mim mesma e o mundo que me cerca durante o fazer artístico. No início do curso, por exemplo, eu não tinha muita consciência do caráter autobiográfico em minha pinturas. Estava envolvida pensando no suporte, questões formais e conceitos que me diziam respeito, mas somente quando eu olhava pro trabalho finalizado é que me via nele, como em um espelho. Foi por meio dele, por exemplo, que me entendi melhor enquanto lésbica e enquanto mulher brasileira.

À medida em que fui me percebendo desvelada em minhas obras, resolvi fazer um esforço maior para me entender enquanto um corpo social e poder “falar” deste corpo e das estruturas sociais que o afetam de maneira mais aberta e consciente. Durante este exercício, fui me enxergando também na experiência e vivências de outras muitas mulheres, inclusive minha mãe.

Meu trabalho me aproximou muito do feminismo e de uma consciência de classe marxista.Tenho aprendido muito também com o trabalho de outras mulheres artistas. Hoje eu vejo meu trabalho como uma oportunidade de denunciar opressões vividas por nós mulheres, num esforço por somar minha voz ao coro daquelas que denunciam as violências patriarcais e capitalistas. Mais do que uma oportunidade de expressão e ação, na verdade, meu trabalho surge primeiro de uma necessidade de materializar minhas insatisfações e pontuar minha oposição ao status quo, o que me ajuda a manter a sanidade.

Você tem algum (a) artista como referência para desenvolver seus trabalhos?

Durante muito tempo, o trabalho visceral e catártico de Louise Bourgeois ressoou em mim e me encorajou a ver a arte como um lugar em que podemos levar ao público assuntos normalmente restritos à esfera privada. Poderia citar também as esculturas vestíveis de Rebecca Horn, as performances de VALIE EXPORT, as esculturas e objetos de Sarah Lucas.

Atualmente, tenho buscado me alimentar de referências brasileiras e latino americanas, como Lygia Clark, Nazareth Pacheco, Rosana Paulino, Ana Mendieta, Márcia X, Doris Salcedo, Miriam Medrez, Juliana Notari, Priscila Rezende, Natália Rezende, Daphne Cunha, Joana Liberal, Adriana Santtana, dentre muitas. Aprendo muito com o trabalho de outras mulheres artistas. Muitas vezes, as referências funcionam mais a nível conceitual e de troca de experiências do que como referencias formais propriamente ditas.

Tem preferência por alguma das técnicas que você utiliza?

Não sei se tenho preferência… Quando entrei na Escola de Belas Artes, comecei os estudos com a graduação em pintura. De forma um tanto inconsciente, meus trabalhos bidimensionais foram gradualmente adquirindo volumes, até que me vi matriculada no atelier de escultura em metal. Desde então, a escultura tem sido o suporte de minhas proposições artísticas.

Mas penso que, no meu caso, esta não é uma escolha que condiciona o trabalho. Ele poderia existir também em outros formatos, técnicas e suportes – como já existiu anteriormente. Tenho muita vontade de unir os vários suportes e técnicas que já trabalhei em um só trabalho, mas ainda não sei como… as vezes sinto que é meu trabalho quem me conduz, e não eu quem determina muito ele.

 

Quais as dificuldades de trabalhar com arte, principalmente no atual contexto em que vivemos?

Trabalhar com arte em nosso país, quando não se é “bem nascido”, é financeiramente e emocionalmente muito desafiador. No atual contexto, então, é um ato de resistência, muitas vezes fruto da necessidade pessoal e de muito amor. O Brasil não tem um histórico de valorização e investimento em Educação e Arte. Desde o golpe sofrido pela ex-presidenta Dilma, que culminou na eleição do atual des-governo, assistimos (e reagimos) ao retrocesso dos passos dados pela gestão anterior e aos crescentes cortes orçamentários nestas áreas.

A realidade de muitos dos meus amigos artistas já era a de se submeterem a trabalhos em grande parte precarizados para manterem as despesas básicas da vida e do fazer artístico. Com a pandemia, e o plano estatal genocida de não gerenciamento da crise e preservação da vida, muitos se encontraram em situações de muita vulnerabilidade.

Mas a arte e a educação são lugares “ameaçadores” de reflexão social e articulação política, e foi através da pressão dos “comunistas” que tivemos a criação de um auxílio que olhasse minimamente para a classe artística. Mas o que salva mesmo são as redes de afeto, solidariedade e criatividade de nós artistas. Reconheço meu privilégio, neste contexto, por ainda poder contar com a ajuda dos meus pais para as despesas básicas e poder me manter protegida dentro do conforto do meu lar.

Quais suas expectativas para o futuro, com sua arte?

Minhas expectativas são bem modestas, na verdade. Adoraria um dia conseguir viver através da minha arte, mas o que espero mesmo é que esta chama que a arte mantém acesa em mim nunca se apague. Espero que a arte continue pulsando em minhas veias e adequando a minha visão e atitudes para a construção de um modelo de mundo que eu acredito: com equidade e valorização do ser humano enquanto vida e não “peças de xadrez”, mercadoria ou matéria prima. Neste mundo, a arte e a educação teriam o reconhecimento do quanto realmente valem e todos que com elas trabalham poderiam viver dignamente de seus ofícios.

Por Ana Gomes

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https://libertasnews.com.br/category/alem/

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