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Nota de posicionamento do Movimento Feminista Mineiro Quem Ama Não Mata (QANM) em relação à tese da “legítima defesa da honra” para explorar a conduta moral de mulheres vítimas de agressões e de feminicídio

A tese da "legítima defesa da honra", um anacronismo odioso

Em 29 de setembro, o STF absolveu, em última instância, um homem, réu confesso, acusado de tentar matar a mulher, em 2016, em Nova Era, Minas Gerais, cuja defesa baseou-se na tese da "legítima defesa da honra ". Essa decisão abre um precedente perigoso, pois é passível de ser replicada, em casos de agressão e feminicídio, em tribunais de todo o país.

O STF poderia ter seguido outra vereda: o caminho jurídico havia sido pavimentado, por decisões do TJMG e do STJ, no sentido de rejeitar o pedido da defesa, por não se basear em provas, mas nessa tese anticonstitucional (e patriarcal). Uma decisão legal e moralmente correta seria convocar novo julgamento. Mas o STF preferiu referendar o Tribunal do Júri. Por isso, causa perplexidade por vários motivos, entre eles, ter legitimado o velho e anacrônico argumento da "legítima defesa da honra", largamente utilizado nos anos 1970 e 1980 e que livrou da cadeia inúmeros assassinos de mulheres - mas banido há tempos dos tribunais do país.

A tese da legítima defesa da honra se baseia claramente na distribuição desigual de direitos entre homens e mulheres. Afirmamos isso com a convicção de que nós, do Movimento Feminista Mineiro Quem Ama Não Mata (QANM), termos, em 1980, desencadeado, a partir de Belo Horizonte, uma campanha nacional que, em 1983, contribuiu para condenar o assassino de Ângela Diniz, durante o segundo julgamento do réu, Doca Street, ao derrubar a utilização machista da tese da “legítima defesa da honra”, que se impunha nos tribunais.

Daí, a tentativa de retornar essa noção jurídica implica trazer de volta costumes que asseguravam aos homens poder “lavar a honra”, supostamente atingida por suas companheiras. Explorar a conduta moral de mulheres vítimas de agressões e de feminicídio é uma estratégia de querer desonrar a história de vida dessas mulheres depois de mortas e revela o que se pretende ocultar: assegurar novamente a “naturalização” pela sociedade de um tratamento desigual de homens e mulheres perante a lei. É, também, uma estratégia para derrubar, um a um, os direitos conquistados pelas mulheres na Constituição de 1988, que garantiu o preceito ético universal de que homens e mulheres são iguais diante da Lei.

Com base nisso, o Movimento QANM vem, intransigentemente, defender que assassinos devem ser julgados com base nas leis do país, incluindo aí, a prática do feminicídio. Essa decisão do STF, no caso de Nova Era/MG, favorável ao agressor, quase assassino, mostra o nocivo espraiamento contemporâneo de ideias conservadoras em desfavor aos direitos da mulher, tão duramente conquistados nas últimas décadas pela ação de movimentos feministas e democráticos. O STF, ao referendar uma decisão do júri popular, mesmo que baseado em leis e normas constitucionais, emite um sinal misógino para toda a sociedade: homens podem matar mulheres pela justificativa de que o corpo; a vida dessas mulheres lhes pertencem “por direito”.

Por tudo isso, o Movimento Feminista Mineiro QANM protesta veementemente contra essa decisão que ressuscita a abominável e controversa figura jurídica da "defesa da honra", pois há divergência de entendimento entre os ministros do STF: dois deles questionaram a decisão dos pares, a exemplo de Barroso, que justificou seu voto contrário por “não querer viver numa sociedade em que homens matam mulheres e saem soltos". Nós, do QANM, também não.

Foto: Divulgaçaõ

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