Notícias

​Rua das Camélias estreia em novembro para contar o cotidiano de uma das maiores zonas de prostituição do Brasil

Tirar conclusões sobre a vida na Rua dos Guaicurus pode ser arriscado. Quanto mais se aprofunda, mais cinza se tornam os contornos dessa realidade. Em agosto de 2015 a Companhia Vórtica deu início a uma pesquisa para conhecer a identidade das mulheres que trabalham nesses hotéis e das vidas que pulsam submersas em preconceito e fantasia. Quem são elas? Por que estão ali? O que há de sedutor nesse lugar tão marginalizado, que atrai jovens de classe média em busca de festas em espaços “alternativos”? O feminismo, tão debatido na academia, alcança as mulheres da Guaicurus? De que forma? Dessa pesquisa nasce o espetáculo Rua das Camélias, que fará sua temporada de estreia entre os dias 05 e 27 de novembro, no Hotel Imperial Palace. 

 

Um espetáculo, uma ocupação, um processo investigativo

Para a diretora Gabriela Luque, a peça é fruto de dois desejos muito fortes: fazer teatro e levantar questionamentos. Segundo ela, a ideia surgiu de uma reflexão sobre livro Hilda Furacão, de Roberto Drummond. “Quisemos descobrir quem são as Hildas dos anos 2000. O que há de diverso entre as dançarinas do Montanhês nos anos 50 e as mulheres que se prostituem hoje na Rua dos Guaicurus? E mais importante: o que elas têm em comum?”, indaga Gabriela. “A recente ocupação cultural que vem acontecendo na região também instigou o grupo, que buscou compreender como se dá o diálogo entre as festividades e as mulheres que ali trabalham”, complementa.

 

A dramaturgia, escrita por Daniel Toledo e Gabriela Figueiredo, deixa claro que o texto não pretende ser um porta voz das prostitutas. A ideia é apresentar o que elas sentiram vontade de compartilhar com o grupo durante a pesquisa e propor uma reflexão. “Não tivemos o intuito de fazer teatro-documentário. Pesquisamos a linguagem da performatividade. Levantamos o material ao longo de 13 meses a partir de visitas ao local, seguidas de uma imersão de quatro meses nos hotéis da Guaicurus, onde o elenco passou a ir semanalmente para conversar com as mulheres. Nesses encontros, procuravam principalmente ouvi-las, evitando direcionar a conversa através de perguntas”, explica Luque.

 

Sara Maranhão assina a cenografia e, em parceria com Istéfani Pontes, a iluminação; Flávia Pacheco, o figurino; DehMussulini assume a direção musical. A preparação corporal é de Ítalo Augusto e Gutto Alves e Istéfani Pontes faz também o estudo de texto com os atores. Integram o elenco Ariadina Paulino, Edsel Duarte, Flávia Pacheco, Gabriel Zocrato, Istéfani Pontes, Marina Abelha e Regina Ganz.

 

Rua dos Guaicurus

Localizada em pleno centro de Belo Horizonte, a Rua dos Guaicurus é o núcleo de uma das maiores e mais famosas zonas de prostituição do Brasil. Das 8 às 23 horas, cerca de 3.000 mulheres (cis e trans) alugam quartos nos mais de 20 hotéis de alta rotatividade instalados na região e destinados à prostituição feminina.

 

 

 

Hotel Imperial Palace

Romeo diPaoli, arquiteto italiano, foi quem projetou o Hotel Imperial Palace, situado na Rua Guaicurus, 436, no Centro de Belo Horizonte. Mais tarde, o edifício foi doado pelo proprietário Rafael Gagliard à Santa Casa de Misericórdia em agradecimento aos cuidados médicos recebidos na entidade. Por se tratar de uma região de meretrício, o imóvel segue despercebido pelas autoridades patrimoniais e culturais, apesar de sua relevância histórica.

 

Num primeiro instante, o edifício funcionou como sanatório para moléstias contagiosas. Na década de 40, Juscelino Kubistchek transformou o edifício num hotel, reconstruindo-o no estilo então em voga, o art déco. Nessa época, os hotéis da região ainda se caracterizavam por abrigar famílias vindas do interior e de outros estados para tentar a vida na capital. 

 

Os apartamentos, inicialmente destinados ao tratamento de doentes, foram depois adaptados para hospedagem e, na última reforma, milimetricamente divididos para a máxima utilização do espaço. Os quartos hoje são cubículos, muitos dos quais internos e sem janela. 

 

“Buscávamos um espaço para apresentação na própria Guaicurus. Não havia como falar do lugar sem levar o público para vivenciar a rua marginalizada. Foi quando descobrimos o Hotel Imperial, que estava fechado há 10 anos”, explica a diretora. Ao ser informada de que o imóvel pertencia ao Grupo Santa Casa, Gabriela Luque procurou a direção da entidade e solicitou a utilização do espaço, obtendo retorno positivo de uma gestão sensibilizada com as artes. A Companhia Vórtica ocupa o hotel desde julho e investiga o espaço como elemento narrativo, procurando dialogar com a história do hotel e da rua em que estão imersos.

Foto: Fernando Badharo

Selecionamos os melhores fornecedores de BH e região metropolitana para você realizar o seu evento.